TV DIGITAL: DESAFIO OU OPORTUNIDADE ?


ÁREA DE OPERAÇÕES INDUSTRIAIS 1 - AO1

DIRETOR
José Mauro Mettrau Carneiro da Cunha


SUPERINTENDENTE
Carlos Gastaldoni


Elaboração:

GERÊNCIA SETORIAL DO COMPLEXO ELETRÔNICO
Paulo Roberto de Sousa Melo - Gerente
Evaristo Carlos Silva Duarte Rios - Engenheiro
Regina Maria Vinhais Gutierrez - Engenheira

Os autores agradecem a colaboração do engenheiro Mauricio dos Santos Neves pela pesquisa sobre a legislação internacional, do Gerente de Informações do BNDES Rosiney Zenaro, da estagiária de economia Morine Alves Fonseca e dos bibliotecários Arthur Adolfo Guarido Garbayo e Maria de Lourdes de Jesus, bem como da Associação Brasileira da Indústria de Radiodifusão (ABIRD), da Associação Nacional de Fabricantes de Produtos Eletroeletrônicos (Eletros), da emissora de televisão Top Cultura de Ouro Preto e das empresas Gober, Linear e Lys-Electronic.

Novembro de 2000


ÍNDICE

1. INTRODUÇÃO 1
2. HISTÓRICO 3
3. ASPECTOS TÉCNICOS 4
3.1. Definição de TV Digital 4
3.2. Da TV Analógica ao DTTB 5
3.3. Descrição dos Sistemas Disponíveis 6
3.4. Aspectos Regulatórios 7
3.5. Os Testes do Grupo ABERT/SET 9
3.6. O Pleito da ABERT 10
4. MERCADO MUNDIAL 11
4.1. ATSC 11
4.2. DVB 12
4.3. ISDB-T 14
5. MERCADO BRASILEIRO 15
5.1. Os Consumidores 15
5.2. A Indústria de Receptores de TV 18
5.3. As Operadoras 19
5.4. A Indústria de Transmissores 21
6. INVESTIMENTOS 22
7. BALANÇA COMERCIAL 23
8. AÇÃO DO BNDES 26
9. PROPOSTAS DE AÇÃO 26
10. CONCLUSÃO 27
BIBLIOGRAFIA: 29



1. Introdução

A televisão aberta e gratuita, fenômeno brasileiro de audiência, atinge cerca de 90% dos lares do País, superando amplamente a TV por assinatura, cuja penetração é da ordem de 7%.

A criatividade nacional é atestada diariamente pela programação gerada pelas redes brasileiras abertas de televisão, a qual possui qualidade reconhecida no cenário mundial e que, por isso mesmo, é exportada há vários anos. Em que pesem todas as críticas que lhe são feitas, a programação brasileira é um inegável sucesso de público, constituindo-se na atividade básica de entretenimento da população, seja por razões circunstanciais, culturais ou financeiras.

Apesar desse balanço, no geral favorável à televisão aberta no Brasil, algumas questões devem ser levantadas no tocante ao conteúdo apresentado. Dada justamente à sua elevada penetração, a TV aberta assume grande importância como veículo de entretenimento, informação, cultura e educação. Assim, merecem especial atenção as disparidades culturais e de renda, associadas a especificidades locais ou regionais. Observa-se, freqüentemente, a exibição de valores e padrões de consumo estranhos a grande parte das comunidades, refletindo tão somente o perfil das elites econômicas nacionais ou mesmo padrões estrangeiros.

Uma resposta a esta questão poderia estar na regionalização da programação - ainda que parcial, para não haver perda do efeito de integração nacional já obtido - , a qual poderia sanar parte das disparidades entre conteúdo televisivo e realidade. Note-se que a ambientação da programação fora dos grandes centros urbanos, como nas novelas, por exemplo, aparece como uma tentativa de atenuação de tais disparidades.

Entretanto, isto se torna tanto mais distante da verdade quanto maior é a heterogeneidade da população atingida, claramente exemplificada nos fortes contrastes existentes dentro das maiores metrópoles do País. Buscando alternativas, a dramaturgia dá vida a estereótipos, construídos a partir de um certo número de personagens reais e coloca em questão temas sociais em evidência ou outros ainda não suficientemente discutidos.

Outro ponto para reflexão é a função de formação exercida pela TV. Embora há mais de vinte anos os psicólogos divulguem estudos que concluem sobre a relação entre a violência assistida na televisão e o aumento de comportamentos agressivos entre a população ainda em formação - crianças e adolescentes -, não se tem notícia ainda de meios efetivos de controle social, e democrático, sobre a qualidade ética da programação exibida.

Os especialistas sabem que, para uma criança, todos os programas são educativos, mesmo aqueles considerados como "puro entretenimento" pelos adultos. As crianças aprendem não somente comportamentos, mas conceitos estereotipados sobre gêneros, etnias, grupos etários etc., de uma maneira pouco controlável pelos adultos, na medida em que tiram dos programas mensagens diversas daquelas que eles poderiam supor. São igualmente vítimas de propagandas enganosas por não possuírem capacidade de crítica desenvolvida, frente a um veículo movido basicamente por interesses econômicos.

Disso podem ser tiradas duas conclusões. Primeiro, o perigo que pode representar a importação indiscriminada de programação estrangeira. Note-se, a esse respeito, que alguns países têm maior vinculação com padrões de comportamento violentos que outros, em função de sua história, cultura e instituições. Não é ocioso apontar, por exemplo, que nos Estados Unidos, tradicional fornecedor de conteúdo para televisão, o direito à posse de armas é tido como absolutamente normal, estando assegurado na Constituição. Segundo, a necessidade de instalação do Conselho de Comunicação Social para regular esses assuntos, entre outros. Na verdade estas questões têm sido discutidas em conjunto no Congresso Nacional, onde tramita uma proposta de emenda constitucional prevendo a abertura do capital das empresas de comunicação a investidores estrangeiros.

No Brasil, a Constituição assegura à União a competência para legislar sobre a radiodifusão e ao Congresso a apreciação de atos de concessão de emissoras. Por outro lado, parlamentares de diversas bancadas têm demandado do Ministério das Comunicações uma Lei dos Serviços de Comunicação Eletrônica de Massa que defina papéis, direitos e responsabilidades nesse contexto, já que a legislação em vigor data de 1963.

Na prática, a administração do espectro de freqüências, e também das licitações para novas concessões, vêm sendo feitas pela Agência Nacional de Telecomunicações - ANATEL, que submete suas propostas ao Ministério das Comunicações e ao Congresso Nacional.

É com este pano de fundo que inicia-se no Brasil a discussão sobre a televisão digital, a qual pode vir a possibilitar grandes avanços, desde a qualidade da transmissão e recepção, passando pela elevação do número de canais disponíveis e chegando até à interatividade, o que pode levar a maioria dos espectadores a deixarem para trás seu papel meramente passivo diante desta mídia.

Coube à ANATEL dar a partida no processo de definição de um padrão de modulação digital - principal parâmetro tecnológico, no caso - para a televisão aberta. Três sistemas lutam por essa escolha - um americano, um europeu e um japonês. As emissoras e as indústrias brasileiras, incluindo as de origem ou sede nos E.U.A., no continente europeu e no asiático têm se posicionado ativamente, realizando testes e promovendo debates.

Deflagrando essa movimentação está a determinação da ANATEL de resolver os inúmeros problemas de recepção do sinal de televisão como chuviscos, fantasmas etc., muito comuns nas periferias das cidades e na recepção de canais outros que não aqueles aos quais está ajustada a antena, como será visto na seqüência.

Por outro lado, pelo simples fato de se estar lidando com uma tecnologia digital, surgem inúmeras possibilidades de utilização além da simples transmissão de imagem e som. A coexistência de até quatro sinais de TV distintos em um mesmo canal, a transmissão de dados, a transformação do aparelho receptor em um terminal interativo são algumas das características dessa tecnologia, as quais já vêm sendo exploradas comercialmente no mundo, ainda que de forma incipiente.

Busca-se analisar, no presente estudo, os impactos da decisão a ser tomada pela ANATEL e, na sua continuidade, do modelo de negócios a ser adotado sobre o padrão de competição nas indústrias de transmissores e receptores. Afinal, trata-se de, a médio prazo, substituir todos os links de transmissão, estimados em 500 milhões de dólares, e toda a base instalada de televisores, atualmente da ordem de 50 milhões de aparelhos.

São também apresentadas considerações sobre a evolução da Balança Comercial brasileira e suas projeções e, por fim, propostas de ação para o BNDES e as instituições brasileiras.

Todavia, vale ressaltar que a introdução da televisão digital só se justificará na medida em que o seu uso for difundido por toda a sociedade, a exemplo do que foi feito pela televisão analógica. A esta, enquanto atividade de radiodifusão, se pode creditar o papel de um dos fatores de integração nacional, por propiciar que todo um país de dimensões continentais e carente de infra-estrutura de transportes, de norte a sul, fale a mesma língua e discuta os mesmos principais assuntos.

2. Histórico

O surgimento da TV digital se deu em função do desenvolvimento da TV de alta definição (HDTV) no Japão e na Europa, há mais de uma década. O Japão foi pioneiro em programas de alta definição, mas por via analógica.

Nos Estados Unidos, a movimentação em torno da TV de alta definição começou em 1987, com o reconhecimento por parte do governo e das emissoras da importância tecnológica e estratégica do serviço. Em 1991 o Federal Communications Commission (FCC) estabeleceu os princípios gerais a serem observados quanto ao emprego da tecnologia digital.

Muitas empresas concorreram com propostas diferentes, mas, depois de vários testes, foi conseguido um consenso entre os desenvolvedores dos quatro melhores sistemas e, em 1993, foi formada a Grande Aliança. Foi proposto um sistema comum, que aproveitava características individuais de cada proposta. Esse sistema foi recomendado pelo comitê consultor no final de 1995. Em 1996, o FCC adotou o padrão ATSC (Advanced Television Systems Committee) para TV digital.

No final de 1998 iniciaram-se, nos E.U.A., as primeiras transmissões digitais.

Já na Europa, ao final de 1991, as empresas transmissoras, as produtoras de equipamentos eletrônicos e os órgãos reguladores começaram a discutir a formação de um grupo para examinar a viabilidade do desenvolvimento da televisão digital, o European Launching Group - ELG.

O ELG se expandiu e passou a incorporar outros grupos, tanto públicos quanto privados, interessados no assunto. Foi feito um MoU (Memorandum of Understanding), estabelecendo as regras a serem seguidas pelos participantes do ELG. Todos os participantes assinaram o MoU em setembro de 1993, e o ELG passou a se chamar Digital Video Broadcasting - DVB. Nessa época foi feito um estudo sobre a viabilidade e perspectivas da TV digital terrestre na Europa, introduzindo questões como o fornecimento do serviço a diferentes mercados consumidores ao mesmo tempo.

O DVB tinha por objetivo desenvolver um sistema digital completo baseado num só padrão para vários países, cada um com características específicas, como sua geografia, por exemplo. No final de 1995 ocorreram as primeiras transmissões digitais na Europa.

Um dos países não europeus a adotar o sistema de DVB foi a Austrália. Lá, o órgão responsável pela área de transmissão, Australian Broadcasting Authority (ABA), nomeou um grupo de especialistas em televisão digital terrestre, que após estudarem o sistema recomendaram sua adoção no País.

No Japão, foi criado, em 1995, com o apoio do governo japonês, redes de TV e principais indústrias do setor, o Advanced Digital Television Broadcasting Laboratory (ADTV-LAB), com o objetivo de digitalizar as transmissões de TV no país. O padrão de modulação adotado foi o europeu COFDM e o orçamento aprovado para ser usado no desenvolvimento de tecnologia foi de 30 milhões de dólares, ao longo de quatro anos.

Em 1997, foi formado o Digital Broadcasting Experts Group (DIBEG), em cuja constituição estão presentes as mesmas entidades anteriores e também grandes empresas não japonesas. Seus principais objetivos são a promoção de intercâmbio de informações técnicas e a cooperação internacional.

Somente em 1999 foi criado o padrão japonês de TV digital, o ISDB - Integrated Services of Digital Broadcasting. Os trabalhos de desenvolvimento desse padrão encontram-se mais adiantados no segmento via satélite, cuja operação está prevista para iniciar-se no final de 2000. Quanto à transmissão digital terrestre, os primeiros testes foram realizados em 1999 e estima-se que esta fase será concluída em 2003.

3. Aspectos Técnicos
3.1. Definição de TV Digital

Trata-se de um sistema de radiodifusão televisiva que transmite sinais digitais, em lugar dos atuais, analógicos. É um sistema mais eficiente, no que diz respeito à recepção dos sinais, pois, na transmissão analógica cerca de 50% dos pontos de resolução de uma imagem se perdem e, portanto, apenas metade deles são recebidos nos lares. Já a transmissão digital permite que a íntegra do sinal transmitido pelas emissoras seja recebido pelos televisores domésticos. Isto significa uma sensível melhora na qualidade da imagem, que se torna também imune a interferências e ruídos, ficando livre dos "chuviscos" e "fantasmas". A transmissão digital de sinais se traduz, ainda, em som de qualidade idêntica àquela obtida com um CD (Compact Disc).

Essa nova tecnologia, pelo fato de ser digital, permite a interatividade do sistema com o telespectador, que passa da passividade a uma atitude ativa frente às transmissões. A televisão digital permite a navegação na Internet, o comércio eletrônico, a transmissão de programas on demand e a comunicação através da TV. A interatividade traz consigo a necessidade de "retorno", ou seja, que a comunicação flua também no sentido do receptor ao emissor do sinal, diferentemente do que ocorre nas transmissões analógicas. Os sistemas existentes provêem esse retorno através de linha telefônica comum, porém já há estudos no sentido de que ele seja feito via telefonia celular.

Comumente a transmissão digital terrestre de TV é designada por DTTB (Digital Terrestrial Television Broadcasting).

Na nova transmissão, os sinais de som e imagem são constituídos por uma seqüência de bits (binary digits), que, pela sua natureza digital, são tratados como dados. Esse sinal de televisão pode ser comprimido com outros sinais antes de ser transmitido. No receptor, todo o conjunto de sinais é descomprimido e convertido. Desta forma, na banda de freqüências ocupada por um canal - 6MHz no caso brasileiro -, onde cabe apenas um sinal de televisão analógica, podem ser veiculadas diversas transmissões simultâneas.

O sistema de modulação é o responsável pela alocação de um sinal de televisão, sempre de mesma largura (por exemplo, 6MHz), como é o de uma emissora qualquer, em diferentes freqüências do espectro. Por exemplo, a correspondência entre os canais VHF e as respectivas faixas de freqüências ocupadas é a seguinte:

Canal VHF Limites de freqüência (MHz)
2 54 a 60
3 60 a 66
4 66 a 72
5 76 a 82
6 82 a 88
7 174 a 180
8 180 a 186
9 186 a 192
10 192 a 198
11 198 a 204
12 204 a 210
13 210 a 216


As modalidades mais conhecidas de televisão digital são a SDTV (Standard Definition Television) e a HDTV. A primeira é um serviço de áudio e vídeo digitais, comumente na relação de aspecto 4:3 (largura:altura da imagem), cujos aparelhos receptores possuem um número de linhas de 408, semelhante à da TV analógica, com 704 pontos em cada uma. A HDTV, cuja imagem possui formato 16:9, é recebida em aparelhos com 1080 linhas de definição e 1920 pontos em cada uma delas. Entre esses dois sistemas existe a EDTV, TV de média definição, que possibilita a utilização de aparelhos com 720 linhas de 1280 pontos. Algumas classificações consideram a EDTV já como televisão de alta definição (HDTV).

O HDTV necessita de uma taxa de transmissão de dados (bits por segundo) bem mais elevada do que a do sistema SDTV, apresentando como principal vantagem a sua nitidez, uma vez que possui um número total de pontos por tela maior do que seis vezes o do outro sistema. Por outro lado, a elevada taxa de transmissão de dados da HDTV leva à ocupação de quase toda a banda do canal com um mesmo sinal de televisão.

Já a SDTV, pelo fato de poder operar a uma taxa menor, permite que numa mesma banda sejam transmitidos até quatro canais de televisão, ou um menor número de canais de TV e vários canais de dados. A figura mostra como na faixa hoje ocupada por um único canal de televisão analógica, de largura igual a 6MHz, podem ser transmitidos, por exemplo: um canal de HDTV com alta qualidade (HD HQ) mais um canal de dados (D); ou um canal de HDTV com média qualidade (HD MQ) mais um canal de SDTV (SD) mais um canal de dados; ou quatro canais de SDTV mais um canal de dados.

POSSIBILIDADES DA TRANSMISSÃO DIGITAL


Fonte: ABERT/ SET (ANATEL)

3.2. Da TV Analógica ao DTTB

Desde o início da transmissão analógica de sinais de TV, foram criados 14 sistemas, tendo o número de linhas horizontais variado, em valores teóricos, entre 405 e 819. Atualmente, existem três sistemas de transmissão de sinais para televisão: NTSC, PAL e SECAM.

O sistema NTSC, utilizado pelos Estados Unidos, Canadá, Groenlândia, Japão e outros países das Américas, possui 525 linhas horizontais e velocidade de 30 quadros por segundo. Na medida em que cada quadro de vídeo é constituído por dois campos, esse sistema possui 60 campos, tendo sido escolhido esse padrão em função de o sistema elétrico ser de 60 Hz (60 ciclos por segundo).

Mais da metade do mundo utiliza os sistemas PAL - Europa Ocidental exclusive França - e SECAM - França e países vizinhos, além da C.E.I. (ex-URSS). Estes sistemas possuem 625 linhas horizontais e velocidade de 25 quadros, ou seja, 50 campos por segundo. No quesito número de linhas, os sistemas PAL e SECAM propiciam imagens mais nítidas do que o NTSC. Entretanto, em termos de velocidade (quadros por segundo), o padrão NTSC apresenta nível de trepidação de imagem (flicker) ligeiramente menor. Por outro lado, a conversão para vídeo, a partir de filmes de cinema, é mais fácil nos sistemas PAL/SECAM, em virtude do padrão internacional cinematográfico ser de 24 quadros por segundo, valor muito próximo dos 25 quadros desses sistemas.

No Brasil é utilizado o PAL-M, ou seja, a adaptação do sistema de origem alemã PAL às peculiaridades brasileiras. Como nossa energia elétrica é gerada em 60Hz, aqui também se usam as 60 varreduras por segundo, entrelaçadas, que dão origem aos 30 quadros por segundo. O "M" refere-se ao número de linhas, 525, configurando uma solução híbrida.

Observe-se que a diversidade de padrões de transmissão de sinais de TV, anteriormente descrita, faz com que o intercâmbio de programas entre países que utilizam sistemas distintos requeira processo de conversão eletrônica, conhecido como transcodificação. Mais recentemente, através de equipamentos específicos e da utilização de tecnologia digital, esse processo foi bastante facilitado, contribuindo para isso também a existência de receptores (TVs e gravadores de videocassete) multi-sistema.

Os principais sistemas de transmissão digital evoluíram dos padrões norte-americano (ATSC, de 1993) e europeu (DVB, de 1993). No fim de 1999, o Japão desenvolveu seu próprio sistema (ISDB), a partir do padrão europeu. Certamente a maior vantagem da transmissão em sistema digital é o fato de não haver perdas em termos de qualidade do sinal, ou seja, o número de linhas horizontais no canal de recepção, mesmo em modo SDTV, é superior a 400, sendo idêntico àquele proveniente do canal de transmissão. Nos sistemas analógicos, em função das perdas, a definição dos transmissores (aparelhos de TV e gravadores de vídeo-cassete) atinge, na prática, somente 330 linhas horizontais, ou seja, ocorre uma perda da ordem de 50%.

É importante observar, contudo, que a transmissão digital de TV, se propicia uma recepção sempre de alta qualidade, exige condições de cobertura e robustez do sistema muito mais críticas para fazê-lo. Na transmissão analógica, localidades distantes dos transmissores - com sinal fraco - ou que enfrentam vários obstáculos no seu percurso, como morros ou prédios, podem exibir imagens cheias de fantasmas e chuviscos. Entretanto, essas mesmas localidades podem não acusar a recepção de qualquer sinal de TV se o sistema digital utilizado não possuir alta robustez ou não for cuidadosamente configurado. Observe-se que a transmissão digital de TV é binária: excelente recepção ou nenhuma recepção (tela negra), não há estados intermediários.
3.3. Descrição dos Sistemas Disponíveis

O ATSC foi desenvolvido pelos Estados Unidos, sob plataformas proprietárias, utilizando a técnica de modulação 8VSB (Vestigial Side Band) e concebido para funcionar na faixa de 6 MHz, além de utilizar o sistema de áudio proprietário Dolby / AC-3. Desde o início, esse padrão pretendia contemplar o HDTV, sendo sua definição de 1.250 linhas horizontais. Por outro lado, o 8VSB não possibilita a recepção através de aparelhos móveis.

O sistema DVB foi resultante do trabalho conjunto de vários países, sendo utilizado o padrão de modulação COFDM (Coded Orthogonal Frequency Division Multiplexing), o qual pode operar com faixas de 6, 7 e 8 MHz. Suas principais características são: o sistema de áudio sob plataforma aberta (MPEG-2), três tipos diferentes de modulação de vídeo (QPSK, 16QAM, 64QAM), compatibilidade com os principais padrões analógicos atuais (PAL, SECAM e NTSC) e possibilidade de transmissão para receptores móveis. Ressalte-se que esse sistema foi concebido com três especificações, para as modalidades de transmissão terrestre (DVB-T), por cabo (DVB-C) e satélite (DVB-S). Inicialmente, a sua implantação não contemplou a HDTV, na medida em que ainda não possui escala comercial compatível, o que resultaria em receptores de alta definição com preços proibitivos. Entretanto, o DVB disponibiliza, desde o começo, imagens e sons de melhor qualidade que os analógicos, além de interatividade com o telespectador. Já estão em operação os primeiros serviços de valor adicionado (transações de Internet e comércio eletrônico, por exemplo), prevendo-se para mais adiante a transmissão em modo HDTV.

O ISDB foi desenvolvido pelo Japão, a partir do DVB, utilizando a segmentação do espectro de freqüência de transmissão de sinais, o que redunda em ocupação flexível dos canais. Isto significa que há possibilidade de veiculação simultânea de vários programas e serviços. Além dos tipos de modulação de vídeo definidos pelo DVB, permite também a utilização do DQPSK. Sua premissa de privilegiar a mobilidade dotou o padrão de uma maior robustez, ou seja, imunidade a interferências. Em sua versão para transmissões pela via terrestre é conhecido como ISDB-T.
3.4. Aspectos Regulatórios

As políticas regulatórias para a TV têm-se defrontado com três questões críticas:

a) garantir que as transmissões digitais serão regidas por regras técnicas que evitem interferência nociva com outros serviços usuários do espectro eletromagnético, bem como homologar tecnologia que garanta qualidade do serviço, considerando-se aspectos de viabilidade econômica;

b) gerenciar o espectro de freqüências - um bem escasso - outorgando licença limitada em número de canais quando a demanda excede a capacidade disponível;

c) formular política para o desenvolvimento da cadeia como um todo, da produção à recepção, com ênfase na condução do processo de transição tecnológica e mantendo-se a competição em todos os segmentos atuantes da cadeia produtiva.

Nos E.U.A., as regulamentações acontecem nos níveis: federal, através do FCC; estadual, através das Public Utilities Commission (PUCs); complementar, tanto federal como estadual, pelas instituições antitruste. Em 1996, com a efetivação da nova Lei de Telecomunicações (Telecom Act), a FCC ganhou força para centralizar a direção regulatória no caminho da criação de rápida competição na indústria, com base no fomento à convergência, tanto tecnológica como de mercados entre várias indústrias (telecomunicações, tecnologia da informação, mídia e entretenimento).

No segmento de televisão digital, o FCC agiu centrando-se em ações de gestão (alocação e recuperação) de espectro, criação de cronogramas para a transição entre as tecnologias analógica e digital, e ajuda na condução da transposição de barreiras de ordem técnica, homologando padrões desenvolvidos e esperando que os próprios agentes iniciassem seus planos de negócio para o lançamento das transmissões digitais, fossem eles motivados por adesões ou por obrigações.

Uma das primeiras questões abordadas pelo FCC tratou da introdução da TV digital por meio da alocação de um segundo canal às operadoras já existentes, sendo estas as únicas elegíveis para esse serviço durante o período de transição. Pelo canal analógico os consumidores continuam a receber a programação tradicional, enquanto que pelo canal digital podem receber novos serviços em receptores digitais ou fazendo uso de aparelhos de conversão especiais (set top boxes), os quais permitem que os programas digitais possam ser assistidos em aparelhos analógicos. Desta forma, as faixas de espectro necessárias a cada um dos canais digitais -sempre de 6 MHz de largura - devem ser alocadas dentro da banda já destinada à transmissão de TV aberta, sendo esta transmissão dupla denominada simulcasting.

Além da regulamentação do cronograma para implantação da TV digital, foi também definida a quantidade de horas de transmissão digital durante o período de transição. Foi regulamentada ainda a recuperação, ao final da transição, do espaço espectral destinado ao serviço analógico.

De uma maneira geral, a discussão regulatória nos E.U.A. tem sido intensa no que tange à criação de regras para reger a transição. Entretanto, a aceitação mercadológica da TV digital não obteve o mesmo sucesso. Por enquanto, nem os anunciantes nem os consumidores estão dispostos a pagar um preço prêmio por um serviço que agrega valor fundamentalmente apenas na qualidade de som e imagem, sendo ainda incerto um mercado para as produtoras que justifique os investimentos e o aumento dos custos operacionais. Com pouca programação, fecha-se um ciclo negativo onde é também inexpressivo o interesse do mercado de equipamentos para recepção.

Assim sendo, o FCC precisará exercer seu papel articulador para mais uma discussão entre os atores envolvidos, devendo esta transcender a simples questão tecnológica ou de cronograma. Precisam ser elaborados planos de negócio que viabilizem a penetração da tecnologia, potencializando interatividade e novas oportunidades de serviços, tornando rentável a realização de investimentos que possam obter retornos atrativos no longo prazo.

Já o continente europeu, representado pelos países membros da Comunidade Européia (CE), tem concentrado sua regulamentação de telecomunicações na direção de liberalização dos mercados, tentando mudar o padrão histórico vigente de monopólio.

A CE estabelece a obrigatoriedade de constituição de autoridades regulatórias nacionais (NRAs), cuja responsabilidade, contudo, tem um caráter subsidiário. Em geral, os reguladores europeus não têm atribuições sobre os segmentos de TV e mídia, cuja responsabilidade cabe a órgãos do governo de cada país, divergindo, portanto, do caso americano.

Primeiramente, a CE centrou-se no estabelecimento das diretrizes para regulamentação tecnológica, visando garantir a integração entre equipamentos usados ao longo da cadeia. A partir de 1997, contudo, ela iniciou o estudo da convergência dos setores de telecomunicações, comunicação social e tecnologias da informação e seus reflexos sobre a regulamentação. Esta vem sendo conduzida de forma flexível pelos países membros da CE, porém com ações que possibilitaram a boa aceitação da TV digital no mercado, principalmente no Reino Unido.

O modelo europeu está fortemente baseado na estrutura de competição já existente nos diversos países, tendo a TV digital se constituído em diferencial para entrantes ou para expansão da base paga analógica. Inicialmente têm sido focadas as transmissões por satélite e por cabo, mesmo nos países onde existe presença significativa da TV aberta. Isto mostra que ainda não estão claros quais são os modelos de negócio sustentáveis para as emissoras abertas, embora deva-se considerar que parte da explicação está ligada ao próprio desenvolvimento tecnológico anterior dos padrões para satélite.

Quanto ao Brasil, ainda não existe legislação específica sobre a transmissão digital de TV.
3.5. Os Testes do Grupo ABERT/SET

Desde 1994, um grupo formado pela Sociedade Brasileira de Engenharia de Televisão (SET) e Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão (ABERT), estuda a passagem do atual sistema de radiodifusão analógico para o padrão digital. A ANATEL, órgão regulador do Governo Federal, deu início ao processo de escolha do padrão digital de TV brasileira, através da abertura da Consulta Pública nº 65, de 27 de julho de 1998. O objetivo desse procedimento era viabilizar os testes de campo com os sistemas digitais disponíveis. Em novembro de 1998, 17 emissoras manifestaram interesse em participar dos testes, entre as quais a Fundação Padre Anchieta - Centro Paulista de Rádio e TV Educativas (SP), SBT e TV Globo. Em seguida, a ANATEL iniciou o processo de contratação de consultorias especializadas para assessoramento em assuntos relativos à TV digital, com destaque para a Universidade Mackenzie (SP) e a Fundação CPqD Centro de Pesquisa e Desenvolvimento em Telecomunicações (ex-TELEBRAS). Ressalte-se que o relacionamento com a Universidade Mackenzie adveio da aplicação de recursos oriundos de incentivo fiscal, em montante superior a R$ 2 milhões, provenientes da fornecedora de equipamentos NEC do Brasil.

Em janeiro de 1999 foi iniciada a importação dos equipamentos, sendo que os primeiros testes de laboratório ocorreram a partir de setembro desse mesmo ano. Os testes de campo foram realizados durante janeiro de 2000, em São Paulo,. A seguir, entre os meses de fevereiro e junho de 2000, houve demonstrações em diversos shopping centers brasileiros - Belo Horizonte (MG), Rio de Janeiro (RJ), Belém (PA), entre outros - ao que seguiram-se visitas da ANATEL a entidades representantes dos três padrões testados, além de órgãos reguladores do serviço de radiodifusão, em vários países.

Os testes realizados, tanto de laboratório quanto de campo, envolveram os três sistemas, muito embora nas fases de planejamento e de início dos testes o padrão japonês ainda sequer existisse.

Na medida em que deve haver um período de transição prolongado, estimado entre 6 e 10 anos, com transmissão simultânea de canais nos padrões analógico (atual) e digital, uma das variáveis estudadas foi a interferência entre canais contíguos, sendo um deles analógico. Além de outros tipos de interferência, foram analisados os comportamentos das variáveis "cobertura do sinal transmitido" e "condições domésticas de recepção", além da transmissão de sinais para receptores móveis. Também foi estudado o desempenho dos sistemas, no que diz respeito à disponibilidade e eficiência dos mesmos, através da variável 'intensidade de campo'.

Em fevereiro de 2000, como um dos primeiros resultados dos testes, concluiu-se que a modulação 8VSB, adotada como padrão americano, não atendia às necessidades do telespectador brasileiro pelo seu desempenho insuficiente na recepção doméstica, especialmente quando são utilizadas antenas internas. Este fato ensejou que a ANATEL colocasse em consulta pública a utilização, na futura TV digital brasileira, do COFDM, comum aos padrões europeu e japonês.

O relatório final dos testes de TV digital, publicado em maio de 2000, confirmou o melhor desempenho dos padrões europeu e japonês, além do desempenho insuficiente do padrão norte-americano nos quesitos transmissão de sinais em áreas de sombra e para receptores móveis. Mais ainda, o padrão japonês, foi julgado superior ao sistema europeu, no que diz respeito à recepção de sinais televisivos em ambientes fechados, assim como pela sua flexibilidade para recepção de programas ou para acesso a serviços, através de terminais fixos ou móveis.

Em 31/07/2000, a ANATEL encerrou a discussão técnica sobre o padrão de TV digital a ser adotado no Brasil através da consulta pública nº 237. Havia expectativa de que esse órgão se pronunciasse quanto à escolha do padrão nacional no mês de setembro de 2000. Entretanto, deverá ainda ser realizada uma audiência pública para comentários relativos ao relatório final dos testes de TV digital, além de prazo adicional para réplica desses comentários, fazendo com que a decisão seja adiada para o final do ano. Além disso, segundo a ANATEL, antes da definição do padrão nacional haverá uma análise do espectro de freqüências, visando ao planejamento e alocação dos canais de televisão digitais, que devem coexistir com os analógicos, bem como a definição dos serviços de valor agregado que serão prestados, como o provimento de acesso à Internet e a realização de transações de comércio eletrônico. Ressalte-se que essa escolha deverá levar em consideração não somente aspectos técnicos, mas também os ganhos em termos de qualidade da programação, som e imagens para o cidadão brasileiro. Adicionalmente, a Agência deverá considerar os impactos da escolha do padrão da TV digital brasileira sobre os setores de radiodifusão, bens eletrônicos e informática, além das implicações nos sistemas de TV paga.

Desta forma, estima-se que nos primeiros meses de 2001 a ANATEL estabeleça um plano básico de canais no padrão digital, em coexistência com os canais analógicos, e dê início à outorga das concessões. Consequentemente, as primeiras transmissões da TV digital brasileira, em caráter experimental, deverão ocorrer no segundo semestre de 2001.

3.6. O Pleito da ABERT

O relatório final dos testes do grupo ABERT/SET apresentou apenas conclusões técnicas, frisando que a escolha do padrão brasileiro deveria levar em consideração também fatores econômicos diversos, de forma a propiciar a rápida disseminação da TV digital por todas as camadas da população.

Nesse sentido, a ABERT apresentou ao Governo sugestões sobre aspectos regulatórios e tecnológicos. Um dos mais relevantes pontos abordados é a necessidade de entendimentos entre o Brasil e o país ou grupo detentor da tecnologia do padrão escolhido, antes da divulgação do mesmo, para que não haja tratamento discriminatório na transferência de tecnologia aos fabricantes nacionais e ao fornecimento direto de equipamentos e componentes. Ela propõe, ainda, a participação ativa de representantes do Brasil no organismo responsável pelo desenvolvimento do padrão adotado, sugerindo uma ação junto aos demais países sul-americanos no sentido de haver a opção por um padrão comum de televisão digital. A ABERT pleiteia também a abertura de linhas de financiamento específicas para operadoras e apoio às fabricantes de receptores de TV, enquanto, por outro lado, solicita a criação de "ex" tarifários (redução substancial de alíquotas) para importação de equipamentos de transmissão sem produção nacional. Finalmente, essa associação defende um cronograma flexível de implantação do padrão brasileiro de TV digital, compatibilizando interesses e características tanto dos fabricantes de receptores quanto das emissoras.

4. Mercado Mundial

O desenvolvimento da TV digital é ainda muito recente, o que faz com que a sua penetração no mundo seja baixa, estando cada tecnologia praticamente restrita ao território que lhe deu origem. Assim, são apresentados alguns dados sobre os três sistemas, seus graus de utilização atual e sobre a transmissão de televisão nesses territórios.

Os preços para os produtos receptores que vêm sendo praticados ou suas estimativas são todos altamente dependentes de escalas de produção que, como se verá, não é maciça em nenhum lugar. É a escala que determina a produção de componentes específicos os quais, por sua vez, levam ao barateamento do produto. Embora já existam chips demoduladores para os três sistemas, protótipos no caso japonês, ainda não se consegue saber de que forma evoluirá a integração dos vários blocos de funções dos receptores digitais. Isto é válido tanto para os set top boxes quanto para os televisores. Além disso, é importante lembrar que o principal item de custo dos televisores é, no caso analógico, e continuará sendo, na tecnologia digital, o cinescópio ou outro tipo de tela que possa ser adotado.

Por fim, os próprios sistemas estão em transformação. Suas especificações vêm sendo alteradas e há apenas uma definição parcial sobre o leque de aplicações ou de tipos de serviço que a transmissão digital de TV viabilizará.
4.1. ATSC

O sistema ATSC, criado nos E.U.A. por um grupo de empresas a partir de uma demanda do FCC, tornou-se internacional em 1996, possuindo atualmente cerca de 200 membros. Tal sistema foi adotado nos próprios E.U.A., no Canadá, em Taiwan e na Coréia do Sul. É interessante observar que a empresa detentora da patente da modulação de vídeo adotada pelo sistema ATSC é a Zenith, a qual, mais recentemente, foi adquirida pela coreana LG.

A Argentina chegou a optar pelo padrão ATSC, porém, antes que qualquer investimento fosse feito, o novo governo resolveu revogar a decisão anterior, aguardando uma maior definição do cenário internacional.

O sistema americano visava inicialmente a veiculação da HDTV, embora permita também a transmissão de SDTV e de canais de dados para a implementação da interatividade.

O serviço de TV digital foi lançado nos E.U.A. em novembro de 1998. Desde o início, foi exigido pelo FCC que as principais redes de televisão cumprissem um programa de áreas de cobertura crescentes.

Segundo a U. S. National Association of Broadcasters, em julho deste ano, o sistema estava em operação em 52 cidades, sendo operado por 148 estações, eqüivalendo a uma cobertura de 64% dos lares americanos com TV. Cabe ressaltar, entretanto, que existem nos E.U.A. cerca de 1600 estações analógicas, ou seja, apenas 9% das estações ativas são digitais. Além disso, menos de 20% da população assiste à televisão terrestre (off-air), sendo a penetração da TV a cabo da ordem de 70%.

As principais redes que, hoje, veiculam programas em HDTV são a CBS, ABC, NBC e PBS, esta última uma rede educativa. Em que pese o interesse do governo americano, a produção de novos programas em HDTV é ainda muito pequena, sendo assim transmitidos, em geral, apenas filmes e competições esportivas. No início de 2000, eram oferecidas aos espectadores americanos não mais que 100 horas de programação digital por semana, somando-se aí todas as redes citadas e as transmissões por assinatura, via cabo e satélite (DTH - Banda Ku). Vale observar que a adoção do padrão ATSC na TV a cabo é incipiente, enquanto que na TV paga via satélite vem sendo adotada apenas para a transmissão de filmes e de serviços como o pay per view.

Algumas operadoras de televisão aberta (broadcasters), principalmente a Sinclair, pleitearam a utilização do padrão COFDM, tendo em vista os problemas técnicos não resolvidos do padrão americano, porém isto lhes foi negado pelo FCC. A orientação do governo tem sido a de que os receptores deverão ser aperfeiçoados no sentido de sanar quaisquer inadequações técnicas. Entretanto, como tem sido dito por consultores da ABERT, alguns desses problemas são inerentes à forma de modulação do sinal, responsabilidade somente da fonte emissora, que segue determinações do padrão.

Os transmissores ATSC diferem dos analógicos e dos digitais dedicados a outros sistemas apenas na parte referente à modulação - módulo de modulação. Assim, um fabricante de transmissores pode adquirir apenas esse módulo da Zenith, por exemplo, para poder ofertar o seu produto.

Quanto aos receptores, não somente a Zenith os produz, mas também diversas grandes indústrias mundiais como as japonesas, as européias e as coreanas. No mercado americano, estão disponíveis os seguintes produtos: set top boxes, receptores digitais integrados e placas de PC, todos aptos a receber tanto HDTV quanto SDTV. O preço de um set top box caiu 50% nos dois últimos anos, sendo atualmente de 649 dólares. Espera-se que esse preço caia ainda mais, atingindo 450 dólares em breve. Já o receptor digital integrado pode ser adquirido por um mínimo de 2.400 dólares. O cartão plug in para PC, que permite assistir televisão no microcomputador, varia entre 200 e 300 dólares.

De acordo com a Consumer Electronics Association, no primeiro semestre de 2000 foram vendidos 50 mil set top boxes e receptores digitais integrados. Foram vendidos também 250 mil receptores com entrada digital (digital prepared), porém isto não caracteriza um movimento que visa a recepção de TV digital aberta e, sim, o uso de aparelhos DVD. Aliás, estatísticas de julho de 2000 mostram que, dos 100 milhões de domicílios americanos com TV, menos de 1% possuem televisores digitais.

Apesar das restrições técnicas do sistema de modulação americano, reveladas pelo relatório da ABERT/SET, o padrão ATSC possui uma característica de valor inegável: uma camada de software com interface aberta - o DASE (DTV Application Software Environment), que permite que as aplicações e os serviços interativos sejam executados normalmente em qualquer receptor.

Além disso, o modelo de negócio adotado, que permite a concorrência não apenas entre operadoras, mas também entre fabricantes de receptores, é um exemplo que deve ser considerado na definição do serviço a ser feita pela ANATEL após a escolha do padrão de modulação.
4.2. DVB

O sistema DVB foi criado, em 1993, por um consórcio de países europeus, visando principalmente a multiplicação de canais, já que a televisão digital permite que a mesma banda que comporta apenas um canal analógico transporte até quatro canais digitais de mesmo formato (SDTV). A flexibilidade do sistema foi também contemplada na sua definição, de forma que através de alguns dos canais simultâneos podem ser veiculados dados, o que propicia o desenvolvimento de aplicações interativas, de Internet etc. É desta maneira, aliás, que a TV digital vem sendo utilizada na Europa, especialmente na Inglaterra, onde ela é mais difundida.

Alternativamente, o sistema DVB permite que, em lugar de até quatro canais de SDTV, seja transmitido um único canal de HDTV, continuando parte da banda reservada para serviços de dados.

Além da flexibilidade, a robustez do sistema foi também privilegiada, na medida em que ele necessita atender a uma grande diversidade de geografias e formas de recepção, como são as dos vários países europeus.

Apesar de desenvolvido na Europa, desde o princípio o sistema DVB visava o mercado mundial, pois suas especificações são extremamente abrangentes e prevêem condições de utilização distintas das européias. Como exemplo, tem-se que, embora naquele continente a largura de banda de um canal de televisão seja de 8 MHz, o DVB permite a sua utilização com larguras de banda de 7 e de 6 MHz, que é o caso nas Américas.

O consórcio DVB possui atualmente, mais de 260 membros, tendo o seu sistema sido adotado, além dos países europeus, pela Austrália, Nova Zelândia, Singapura e Índia.

O gráfico adiante mostra o mercado representado pela televisão e sua distribuição segundo a tecnologia de transmissão, em diversos países do continente europeu. O caso brasileiro é apresentado também para permitir uma melhor comparação.

É importante ressaltar que a Inglaterra é o país de maior penetração do sistema DVB terrestre, com cerca de 1 milhão de usuários. Segundo a Datamonitor, em 2004, cerca de 50% do mercado europeu será ocupado pela televisão digital paga por satélite, enquanto que a TV digital por cabo e terrestre ficarão com 34% e 15%, respectivamente.

Na Europa, são produzidos 2,5 milhões de set top boxes por ano. Seus preços aos consumidores são subsidiados pelas operadoras, que os fornecem aos assinantes, caracterizando a televisão digital terrestre como um serviço pago. Já os aparelhos de TV, cujas vendas são ainda muito modestas, permitem o acesso a um número crescente de canais digitais gratuitos. Tais aparelhos, SDTV e EDTV, com formato 16:9 e alguns 4:3, possuem um preço que varia de 750 a 3000 dólares.

O modelo de negócio adotado a princípio diferia radicalmente do americano. A televisão digital era mais uma modalidade da TV paga, vinculando usuário e operadora e também impedindo a livre concorrência no mercado de receptores: os set top boxes eram proprietários das emissoras, que colocavam a sua fabricação em indústrias escolhidas, e os subsidiavam aos usuários. Já se verifica, contudo, o surgimento de aberturas nesse mercado, na medida em que transmissões gratuitas começam a ser feitas e produtos são ofertados nas lojas, permitindo ao usuário a livre escolha dos receptores. Isto, aliás, só é possível graças à existência de uma camada de software com interface aberta - MHP - usada por todos os fabricantes, a qual propicia que os serviços interativos sejam realizados por qualquer receptor, substituindo os aplicativos proprietários da TV paga.

4.3. ISDB-T

O sistema ISDB-T (para transmissões terrestres) foi criado em 1999, no Japão, por um grupo de empresas, fabricantes e operadoras de televisão e de telecomunicações, capitaneado pelo governo. Seu recente desenvolvimento deu-se como segundo movimento de um trabalho iniciado em 1995 com o objetivo de digitalizar todos os sistemas de transmissão de televisão. Esse trabalho foi iniciado pela transmissão de TV (broadcasting) via satélite, que deverá ser lançada, no Japão, no final do ano de 2000, veiculando HDTV, SDTV, dados e áudio. Para tanto, os aplicativos necessários estão sendo desenvolvidos.

Os receptores para a transmissão via satélite já estão sendo disponibilizados nas lojas japonesas, havendo a previsão de que, a médio prazo, todos os aparelhos de TV possam receber, indistintamente, transmissões terrestres, via satélite ou via cabo.

Quanto aos receptores para televisão digital terrestre, deverão ser colocados à venda na mesma época do início das transmissões, previstas para 2003 nos três maiores centros urbanos daquele país - Tokyo, Osaka e Nagoya -, e para 2006 nos demais. Por enquanto, não existe a fabricação desses aparelhos, até porque a documentação técnica para os fabricantes somente deverá estar disponível no último trimestre de 2000.

Por ser um sistema bastante recente, ainda nenhum outro país, além do Japão, adotou o ISDB-T. Contudo, tal como o europeu DVB, ele foi desenvolvido visando o mercado mundial. O sistema japonês baseou-se nos conceitos do DVB, com um aprimoramento de suas qualidades de robustez e flexibilidade. Esta última permite que sejam transmitidos dados, imagem e som, com tipos de modulação e taxas de transmissão diferentes, configuráveis em até três grupos independentes e reprogramáveis de sinais. Outra vantagem do ISDB-T é o fato de haver sido desenvolvido tendo a mobilidade como pré-requisito, tornando-o adequado para a recepção portátil de dados e imagens. Os produtos que farão uso desta facilidade ainda não foram criados, podendo o sistema ISDB-T ser visto, em parte, como provedor de uma infra-estrutura a partir do qual serão ofertados aparelhos e construídas aplicações ainda não imaginados.

O Japão possui tradição em HDTV analógica, sendo, ao lado da França, um dos únicos lugares do mundo onde ela foi efetivamente implantada. Existem lá, atualmente, mais de 840 mil receptores HDTV analógicos, encontrando-se esse número em franco crescimento nos últimos cinco anos. O número total de horas de programação em HDTV no mês de julho de 2000 foi de 511, esperando-se um pequeno aumento para agosto. As transmissões em HDTV privilegiam os documentários, com cerca de 24% das horas de transmissão, porém distribuem-se de forma harmônica entre os demais gêneros, que ocupam, cada um, entre 10% e 14% do tempo de transmissão.

No Japão existem 45 milhões de domicílios e uma base instalada de 100 milhões de aparelhos de TV. É interessante observar que, segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) do IBGE, em 1999 o número de domicílios brasileiros era de 43 milhões. A população japonesa é da ordem de 127 milhões de pessoas, enquanto que, no Brasil, existem cerca de 160 milhões de habitantes.

Embora a penetração da TV via satélite no Japão seja elevada, algo em torno de 30%, ela representa um adicional de TV paga com programações especiais. Mais de 78% dos lares japoneses são atingidos pela TV terrestre, da qual existem cerca de 15 mil estações de transmissão, sendo de, aproximadamente, 20% a parcela dos lares que assistem TV via cabo.

As vendas anuais de televisores no Japão são de 10 milhões de aparelhos por ano. A esse respeito, cabe observar que no Brasil, em 1996, chegou a ser atingida a marca de 8,5 milhões de televisores vendidos, sinalizando o potencial deste mercado, como será visto na seqüência. Quanto aos preços japoneses, foi anunciado que um televisor digital integrado de 36" top de linha será vendido a 5 mil dólares, enquanto que um display HD de 32" custará 2,3 mil dólares. Já os set top boxes deverão ser comercializados com preços entre 500 e 800 dólares.

Não há qualquer definição sobre o modelo de negócio que será adotado no Japão, até porque a potencialidade do sistema dá margem à criação de inúmeras possibilidades de aplicações. Embora concretamente ainda não existam os produtos, como os receptores por exemplo, sabe-se que já foram produzidos os chips protótipos específicos para demodulação do ISDB-T. Além disso, somente esse módulo demodulador deverá diferenciar o receptor de qualquer um dos três sistemas, sendo o restante do aparelho sempre idêntico.

Tudo isto faz com que o sistema japonês coloque nas mãos de quem o adotar como padrão, ao lado de inquestionáveis vantagens técnicas de robustez e flexibilidade de operação, propiciando o desenvolvimento de novos serviços, a grande responsabilidade de modelar e regular todo o negócio, especialmente no que tange às aplicações ainda não criadas.

5. Mercado Brasileiro

Como preparação para a sua decisão, a ANATEL contratou à Fundação CPqD a realização de uma pesquisa com o objetivo de avaliar o mercado de televisão digital brasileiro sob a óptica dos consumidores (telespectadores), das operadoras de televisão aberta e das indústrias de receptores de TV. Todos os levantamentos de informações foram feitos no segundo semestre de 1999 e as conclusões da pesquisa apresentadas à ANATEL. De posse dos resultados, a Agência julgou conveniente estender a pesquisa junto ao segmento de consumidores através de demonstrações comparativas entre uma TV analógica e uma TV digital de alta definição. As demonstrações foram levadas a cabo em diversas capitais do País durante a primeira metade de 2000 e seus resultados apontam na mesma direção da pesquisa anterior.

A seguir, além dos principais resultados do trabalho do CPqD, é apresentado também um panorama do segmento brasileiro de bens de capital envolvido na questão da TV digital, quais sejam os produtores da infra-estrutura de transmissão.
5.1. Os Consumidores

A pesquisa do CPqD, que abrangeu amostras das classes sociais de A a D, revelou que a televisão faz parte da vida cotidiana das pessoas, constituindo-se não apenas em uma forma de entretenimento, mas em um importante elemento formador de cultura, moral e educação. O papel da TV aberta nesse cenário é fundamental tendo em vista a baixa penetração da TV por assinatura nas várias regiões do País, mostrada no quadro a seguir. A TV aberta, por seu turno, tem uma penetração da ordem de 90%.

Região Domicílios com TV paga (%)
Sudeste 12
Centro-Oeste 6
Sul 5
Nordeste 5
Norte 5
Fonte: CPqD

A PNAD99 do IBGE permite concluir que o televisor é o terceiro eletrodoméstico adquirido pela população brasileira, ficando atrás apenas do fogão e do rádio. A mesma pesquisa constatou que a presença da televisão nos domicílios brasileiros cresceu de 81%, em 1995, para 88%, em 1999, estando mais concentrada nas áreas urbanas, em que atingiu 93% das residências. A distribuição desses televisores pelas regiões urbanas brasileiras é a seguinte:

Região Domicílios com TV (%)
Sudeste 96
Centro-Oeste 92
Sul 94
Nordeste 88
Norte 88
Fonte: PNAD99 (IBGE)

Segundo a Eletros, o número médio de receptores de TV por domicílio dobrou durante a década de 90, alcançando a marca de 1,25 em 1999. Sabendo-se que o número de domicílios encontrado pelo PNAD99 é de 42,85 milhões chega-se a uma base instalada de televisores superior a 50 milhões de aparelhos.

Vale a pena comparar todos esses números com a distribuição da renda domiciliar dos brasileiros em 1999, mostrada a seguir. É fácil verificar que os índices de penetração da televisão aberta no Brasil jamais poderiam ser alcançados se não houvesse a adesão maciça das classes econômicas menos privilegiadas.

De acordo com o CPqD, a aceitação da TV digital pelos telespectadores deverá ser plena, na medida em que imaginam que a TV do futuro oferecerá serviços interativos, possibilitando ao consumidor escolher a sua programação e o horário mais conveniente para assisti-la. Entretanto, o principal serviço esperado, que diferencia a TV digital da analógica, é a transmissão com alta definição, com imagem e tela semelhantes às do cinema e som de qualidade comparável à do CD (compact disc).

Segundo o CPqD, os consumidores acreditam que, de início, os preços dos receptores de televisão serão elevados, caindo com a sua disseminação. A utilização de conversores - set top boxes - de sinais digitais para uso com os aparelhos de TV atuais foi admitida como alternativa necessariamente mais barata. De maneira geral, configura-se uma situação em que os conversores permitiriam a utilização de receptores analógicos ainda novos, os quais seriam mais tarde substituídos por receptores digitais.

O tempo de vida médio de um televisor, segundo dados da Eletros, é de 10 anos. Por outro lado, os tempos médios desde a compra do último aparelho de TV nas diferentes regiões do País foram investigados pelo CPqD e podem ser vistos no quadro abaixo. Confrontando-se esses números vê-se que a opção dos consumidores pelos conversores é bastante provável.

Região Idade média do atual receptor (mês)
Sudeste 49
Centro-Oeste 47
Sul 44
Nordeste 45
Norte 39
Fonte: CPqD

Avaliação

Os espectadores entrevistados pelo CPqD, em cada uma das regiões geográficas, recebem o sinal de televisão conforme apresentado na tabela abaixo. Cabe observar que esses números referem-se à TV aberta, não sendo mostrados os percentuais relativos à TV por assinatura, que completam a totalidade de espectadores em cada região.

Região Antena Externa Antena Interna Antena Parabólica
Sudeste 54% 16% 19%
Centro-Oeste 47% 25% 22%
Sul 44% 28% 21%
Nordeste 37% 29% 30%
Norte 41% 13% 41%
Fonte: CPqD

Verifica-se a grande importância de garantir uma recepção interna (indoor) adequada, pois ela é utilizada por uma parcela expressiva da população.
5.2. A Indústria de Receptores de TV

A indústria de televisores brasileira está integralmente localizada em Manaus, sendo constituída por cerca de uma dezena empresas, das quais a esmagadora maioria tem vínculos de capital e tecnologia com grandes corporações transnacionais.

A evolução das vendas industriais de televisores coloridos no Brasil está mostrada no quadro a seguir. Verifica-se que, após um período de vendas crescentes, cujo ápice foi atingido em 1996, o segmento de televisores passou por uma forte redução da demanda, refletida em queda dramática de preços e fechamento de algumas unidades industriais. Com a recuperação do setor, iniciada no segundo semestre de 1999, espera-se que em 2000 seja superada a marca dos 5 milhões de aparelhos vendidos.

Em milhões de unidades
Vendas Industriais 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000*
Televisores em Cores 4,99 6,07 8,54 7,84 5,84 4,03 2,19
* até junho
Fonte: Eletros

Apesar da queda em números absolutos - junto com as vendas totais -, a participação relativa dos televisores de tela grande na venda total de televisores tem crescido continuamente ao longo dos últimos anos, passando de 3%, em 1994, para atuais 16%. Este índice foi alcançado em 1998 e estabilizado pela retração de crédito vivida no mercado de eletrônicos de consumo a partir daquele ano. É lícito, portanto, supor que, com a recuperação do setor, a participação dos televisores de tela grande nas vendas volte a crescer, alcançando 20% num horizonte breve.

A penetração da televisão nos lares brasileiros - de 1,25 - está abaixo da que ocorre em outros países da América Latina, como o Chile, onde esse índice é quase de dois aparelhos por domicílio. Esse fato, aliado à expansão da demanda de televisores de tela grande, aponta para um mercado potencial ainda não atendido, embora fortemente vinculado ao aumento de renda da população e/ou à disponibilidade de crédito. É importante observar que, segundo a Eletros, há pesquisas que comprovam que a principal razão que move 75% dos consumidores brasileiros é o apelo de possuir a tecnologia mais moderna.

De acordo com o CPqD, os fabricantes de televisores brasileiros vêem a chegada da TV digital como uma oportunidade de revigorar o mercado interno e de incrementar a competitividade do País a nível global. As empresas internacionais, inclusive, revelaram a possibilidade de exportação de produtos para os mercados da América Latina.

Embora a transmissão digital melhore sensivelmente a recepção dos sinais de imagem e de áudio de todos os canais, que passam a ter excelente qualidade de recepção simultaneamente, os fabricantes acreditam que os principais atrativos da TV digital para o consumidor são a HDTV e os serviços de natureza interativa.

O processo de escolha do padrão de modulação tem sido acompanhado ativamente pela indústria. Algumas empresas têm demonstrado o funcionamento do ATSC e outras do DVB, embora a maioria delas disponha de tecnologia em ambos os padrões, através dos seus controladores. Quanto ao ISDB-T, não tem sido defendido pela indústria de televisores pois, pelo fato de ser muito recente, os receptores para tal sistema ainda não estão disponíveis comercialmente. Entretanto, sabe-se que não aderir ao sistema de modulação eleito pela ANATEL significa, para um fabricante, abrir mão de disputar o mercado brasileiro. Isso foi confirmado pela indústria, na pesquisa do CPqD, na medida em que as empresas explicitaram a intenção de firmar acordos tecnológicos caso o sistema escolhido ainda não esteja incluído no seu programa próprio de desenvolvimento.

As mesmas fabricantes acreditam que, após a divulgação da escolha da ANATEL, poderão disponibilizar seus produtos para o mercado em um prazo que varia de 6 a 24 meses. Assim, sendo mantido o atual cronograma da ANATEL, os primeiros produtos para recepção digital deverão estar sendo lançados pela indústria nacional no final de 2001 ou início de 2002.

Nos E.U.A., segundo a ATSC, os preços dos produtos vêm declinando, já atingindo 650 dólares para os set top boxes e 2.400 dólares para os televisores de alta definição integrados. Estes preços são ainda muito elevados para o consumidor brasileiro, principalmente frente ao preço dos televisores coloridos estereofônicos analógicos de 21 polegadas, que custam da ordem de 300 dólares. Por conseguinte, espera-se que as escalas demandadas no início das transmissões digitais sejam pequenas e destinem-se ao consumo das classes A e B. Com a consolidação dos padrões de transmissão e definição dos serviços agregados, deverão surgir novos componentes que baratearão o custo dos produtos, o que, em paralelo com a fabricação em largas escalas e a oferta maciça de programação digital pelas operadoras, deverão levar a preços aceitáveis por outras classes econômicas. É importante frisar que, para que um produto alcance escalas de massa, obrigatoriamente deve haver a adesão da classe C (equivalente a mais de 30% do mercado) ao seu consumo, sem o que ele não pode ser democratizado nem atingir custos compatíveis com tal grau de disseminação. Isto deverá ocorrer, segundo a Eletros, em um prazo máximo de cinco anos.

O período de transição, desde o lançamento dos primeiros produtos até a sua aquisição pela população em geral, foi estimado entre dez e quinze anos pela indústria de televisores. Este seria também o prazo para substituição da base instalada de receptores analógicos pelos aparelhos com tecnologia digital, já que a duração média de um televisor é de dez anos.
5.3. As Operadoras

Segundo dados da ANATEL de 28.06.2000, existem no País da ordem de 300 geradoras ativas de televisão, enquanto que o número de retransmissoras em operação supera 8.300. Vale observar que são consideradas geradoras todas as emissoras que fazem qualquer inserção local no sinal transmitido, mesmo que a duração dessa inserção seja muito pequena e que a emissora atue basicamente retransmitindo o sinal gerado por outra.

A distribuição dos canais ativos ao final de 1999 entre as redes nacionais de televisão foi levantada pelo CPqD em suas entrevistas junto às emissoras. A partir da sua comparação com os dados oficiais da Anatel pode-se construir o seguinte gráfico de participações nos totais de geradoras e retransmissoras.

Nem todos os canais previstos no Plano Básico da ANATEL estão ocupados, sendo que alguns, inclusive, estão sendo licitados. No final de junho havia, aproximadamente, 3.600 canais vagos, dos quais mais de 200 para geradoras.

As emissoras entrevistadas pelo CPqD acreditam que a transmissão digital poderia ser iniciada dois anos após a emissão das licenças pela ANATEL. Já a transição do sistema de transmissão analógico para o digital, deve ocorrer gradativamente ao longo de um período durante o qual todas as emissoras estariam se digitalizando, ao mesmo tempo em que os consumidores estariam substituindo seus receptores por aparelhos digitais. Segundo elas, esse período poderia ser de dez anos, ajustável de acordo com o número de receptores digitais efetivamente instalado, à semelhança do procedimento que o FCC vem adotando nos E.U.A.

No caso das maiores operadoras brasileiras, cerca de 40% dos estúdios de geração já estão digitalizados, fazendo-se a conversão do sinal digital para o analógico apenas no momento da transmissão. Decorre daí que entre 40 e 60% dos programas produzidos por essas emissoras são digitais, embora no formato SDTV. É importante observar que não existe no País produção de programação em alta definição e que esta requer, para a sua implementação, investimentos expressivos não apenas em equipamentos, que necessitam ser praticamente todos específicos para tal finalidade, como também em cenários, maquiagem etc.

Quanto às pequenas geradoras, é fato que muitas já vêm lidando com deficiências de equipamentos para produção de programação, em razão, principalmente, de escassez de recursos vindos da publicidade ou patrocínios. A TV digital, pelo menos a princípio, tenderá a agravar tal situação, pois traz uma maior necessidade de investimentos, sem a contrapartida simultânea de uma ampla disseminação de aparelhos para aumento da receita publicitária ou proveniente de serviços associados. No caso das emissoras educativas este problema é ainda mais grave, na medida em que, proibidas de veicular comerciais e de receber apoios culturais, seu acesso a novos recursos é mais limitado.

Apesar de uma inequívoca melhora na qualidade do som e imagem transmitidos e do grande potencial para implementação de aplicações interativas, capazes de transformar um espectador passivo em um espectador ativo, a pesquisa do CPqD junto às emissoras mostra que elas acreditam que o diferencial capaz de motivar o consumidor a adquirir um aparelho de televisão digital seria trazido pela HDTV.

Desta forma, a concorrência por maiores índices de audiência e, consequentemente, por aumento de publicidade, poderia ser alavancada pela transmissão em HDTV dos programas mais importantes. Foram assim considerados os grandes espetáculos, como o Carnaval e os campeonatos esportivos, e filmes. Algumas emissoras já realizaram experiências com a HDTV, de forma que é possível esperar que logo no início do serviço de TV digital aberta no País sejam feitas transmissões desse tipo. O crescimento da programação em HDTV dentro da grade das emissoras deverá evoluir gradativamente, estimando-se um período de quinze anos até que todos os programas sejam assim transmitidos.

As emissoras entrevistadas acreditam que os preços dos televisores digitais precisam atingir rapidamente preços convidativos para os consumidores a fim de que os canais digitais alcancem um número razoável de espectadores. Só com índices de audiência elevados as emissoras poderão, através da venda de publicidade, viabilizar o retorno financeiro dos novos investimentos. Cabe ressaltar que a transmissão digital permite a veiculação seletiva de publicidade - por região geográfica, por camada social, por perfil de interesse etc. - , o que poderá ampliar o número de anunciantes.
5.4. A Indústria de Transmissores

Segundo a ABIRD - Associação Brasileira da Indústria de Radiodifusão, a participação nacional no aparelhamento de um estúdio de televisão não ultrapassa 15%. Por outro lado, é produzida no País a quase totalidade dos equipamentos de transmissão - transmissores, retransmissores, antenas e torres. Alguns dos seus fabricantes, inclusive, usufruem dos benefícios da Lei nº 8.248, de 23.10.1991, conhecida como Lei de Informática, a ser sucedida por um projeto de lei atualmente em tramitação no Congresso.

A mais antiga empresa brasileira de equipamentos de transmissão é a Lys Electronic, do Rio de Janeiro. Além de pioneira, presente no mercado desde a década de 60, ela tem sido também uma formadora de especialistas para o setor. A Lys acompanhou todos os desenvolvimentos da televisão no País, inclusive a transição para a transmissão colorida.

Com a concessão de novos canais de televisão nos anos 70 e 80, e conseqüente crescimento do mercado, surgiram diversas outras empresas para atendimento das necessidades de transmissão das emissoras tanto de televisão quanto de rádio. Dentre as empresas criadas nesse período, destacam-se a Linear, de Santa Rita do Sapucaí - MG e a Telavo, de São Paulo.

O advento do governo Collor, que estancou o processo de novas concessões, deu início a uma forte queda de demanda para todas essas empresas. A ABINEE estima que, entre os anos 89 e 91, tal redução tenha sido da ordem de 75%. O restante da década de 90 não foi muito diferente, assegurando à indústria apenas reposições e pequenas expansões.

Atualmente, são ofertantes nesse mercado as empresas nacionais listadas a seguir, todas de porte pequeno ou médio. Cabe observar que apenas os transmissores e as antenas para potências superiores a 20 kW, utilizados nos maiores centros urbanos, são importados.

a) transmissores com potência até 20 kW, de tubo (válvula), ou até 2kW, transistorizados: Lys e Telavo;
b) transmissores com potência até 10 kW, transistorizados: Linear;
c) transmissores de baixa potência (até 1 kW): Plante RF, Teclar e Energia;
d) antenas: Trans-Tel, Mectronica e Gober.

Embora as emissoras de televisão sejam classificadas como geradoras ou retransmissoras em função de fazerem ou não inserções locais nos sinais que irradiam, os equipamentos de transmissão são idênticos, apesar de serem diferenciados em sua denominação e, assim, homologados como transmissores ou retransmissores.

Ora, o número de transmissores de televisão existentes no País com potência igual ou superior a 1 kW gira ao redor de 400. Fazendo-se a simplificação de atribuir um transmissor a cada emissora, o que nem sempre é verdade, e sabendo-se que estão em atividade mais de 8.600 operadoras brasileiras, verifica-se que uma grande parcela desse mercado é atendido por equipamentos de baixa potência, fornecida igualmente por um maior número de fabricantes.

No segmento de potência igual ou superior a 1kW, pouco mais de metade da atual base instalada é de fabricação Lys ou Telavo. Estas duas empresas estão, já há algum tempo, a caminho de uma associação, a qual vem sendo amplamente divulgada no setor.

Quanto à Linear, é hoje a maior fabricante de equipamentos para transmissão de radiodifusão do País. Cerca de 40% da sua produção é exportada, possuindo clientes em mais de 20 países nas Américas, África, Ásia e Austrália.

Neste contexto, as novas concessões em televisão digital têm sido vistas como uma grande oportunidade, na medida em que representam uma forte expansão de mercado para a indústria de equipamentos de transmissão. Entretanto, podem também constituir-se em ameaça, caso as empresas não tenham acesso às novas tecnologias de modulação ou não consigam adaptar-se ao novo modelo de empresa ágil e eficiente, capaz de subsistir em um mercado de concorrência global, profundamente diverso daquele que vigorou no setor até o final dos anos 80.

6. Investimentos

A Eletros prevê que os recursos necessários para adaptação e criação de linhas de produção de televisores e set top boxes digitais, além de outros investimentos associados como, por exemplo, o treinamento da mão-de-obra, o pagamento de licenças e a formação de estoques de componentes, deverão ser da ordem R$ 200 milhões no primeiro ano.

A digitalização da televisão envolverá investimentos em estúdio, provavelmente com grandes volumes de importação, e em transmissão, envolvendo não somente os links terrestres, mas também novos transponders em satélites etc.

A construção desses novos links digitais está sendo orçada pelas empresas em cerca de 500 milhões de dólares, considerando que, nas grandes cidades, cada novo sistema de transmissão poderá custar entre 2 e 3 milhões de dólares.

Esse cálculo está baseado no fato de que, independentemente do padrão de modulação a ser adotado, todas as operadoras de TV aberta, sejam elas geradoras ou retransmissoras, precisarão de novos transmissores. Como a entrada da televisão digital se dará paralelamente à transmissão analógica, haverá a duplicação da infra-estrutura - torre, antena, transmissor, fontes de energia etc. Eventualmente, até um novo prédio para abrigar os equipamentos poderá ser necessário.

Os investimentos das emissoras impactam diretamente a indústria brasileira de bens de capital - infra-estrutura de transmissão e equipamentos de estúdio. A nova perspectiva de mercado crescente certamente demandará investimentos também por parte de tais fornecedores, o qual ainda não foi quantificado.

Contudo, possivelmente o maior investimento a ser feito é o do público consumidor. A médio prazo, toda a base instalada de televisores do País, hoje estimada em mais de 50 milhões de aparelhos, deverá ser substituída por aparelhos digitais. Cabe observar que essa base está em expansão e tendendo a equipamentos com telas grandes. Naturalmente que, no meio tempo da transição, haverá ainda o investimento em set top boxes para utilização em conjunto com os televisores analógicos.

7. Balança Comercial

A evolução da Balança Comercial do Complexo Eletrônico no período de 1996 a 2000 é a seguinte:

Algumas observações podem ser feitas, sendo a mais imediata a de que certamente o déficit comercial brasileiro em 2000 deverá alcançar os 6 bilhões de dólares.

As importações de produtos de informática continuam crescendo gradualmente, acompanhando o crescimento do segmento, em que pese a existência de um gray market nada desprezível. Algumas exportações vêm sendo feitas, mais por iniciativas próprias resultantes de reconfiguração do mercado internacional das empresas do que por grandes mudanças nas condições de competitividade brasileiras.

Em telecomunicações, as importações estão estabilizadas ao redor de 2,5 bilhões de dólares. É importante considerar os esforços que têm sido feitos pelo governo, principalmente através do BNDES, para incentivo à produção local. Isto tem permitido que, não obstante o segmento esteja em franca expansão, os investimentos feitos na indústria atendam as novas demandas, como a da telefonia celular, e até haja exportação desses produtos, em particular de terminais portáteis e estações rádio-base.

A nova infra-estrutura de transmissão para TV digital está considerada dentro do segmento de telecomunicações, podendo ser assim detalhada:

Como esperado, verificam-se pequenos valores de importação para transmissores de TV. O mesmo acontece com as antenas, embora elas não possam ser discriminadas do total geral. Vale a pena lembrar que todos estes valores podem vir a apresentar crescimentos elevados nos próximos anos caso as indústrias nacionais não consigam transformar-se e disponibilizar produtos com as novas tecnologias.

Quanto aos segmentos de eletrônica de consumo e de componentes, serão analisados com maiores minúcias na seqüência em razão de sobre eles se refletir diretamente a adoção da TV digital no Brasil.

As importações de produtos acabados e também de partes e peças para esses produtos sofreram uma drástica redução a partir do final do 1997, devida à forte contenção da demanda, como visto. Vale ressaltar que, embora os componentes eletrônicos estejam discriminados em tabela à parte, todas as peças e subconjuntos estão aqui incluídos.

Via de regra, a indústria de consumo brasileira depende da importação dos componentes eletrônicos e muitas vezes também do projeto dos produtos, caso em que recebe dos respectivos fornecedores de tecnologia kits de subconjuntos ou até mesmo de produtos inteiros para montagem. Naturalmente que a competitividade internacional dos produtos torna-se difícil, na medida em que há uma grande dependência de importações para a sua montagem. Além disso, os preços dos kits freqüentemente são negociados de forma a inviabilizar a concorrência internacional do fabricante brasileiro com o seu fornecedor.

Com o início da recuperação do segmento de consumo, espera-se, já para este ano, um aumento de importações de partes e peças.

É interessante observar um pequeno aumento das exportações de produtos de vídeo a partir de 1999. Trata-se de televisores fabricados principalmente pela Philips e pela LG, que redirecionaram parte de sua produção para o mercado externo como forma de evitar uma maior ociosidade em suas linhas de montagem.

A introdução da TV digital certamente fará crescer as importações dos produtos de vídeo, num primeiro momento em que não haja escala para a sua produção local, sendo depois substituídas ou acrescidas pelas importações de partes e peças.

Quanto ao segmento de componentes, observa-se no quadro abaixo que o déficit tem se mantido ao redor dos 2 bilhões de dólares. De certa forma pode-se dizer que a contração da eletrônica de consumo tem sido compensada pela expansão das telecomunicações já que os componentes eletrônicos utilizados no Complexo não podem ser distinguidos segundo a sua destinação.

É importante observar o crescimento expressivo das importações de placas de circuito impresso e de semicondutores, com especial ênfase nos circuitos integrados que, sozinhos, já estão chegando a ser responsáveis por metade das importações.

As importações de cinescópios declinaram a partir de 1998 novamente devido à crise do segmento de consumo. Tendo em vista que o cinescópio é fruto de um processo cuja produção não permite grandes mudanças em seus volumes, as fabricantes brasileiras redirecionaram parte dela para o mercado internacional. Assim, no mesmo ano de 1998 verificou-se um expressivo aumento da exportação de cinescópios pela Philips e Samsung, a qual manteve-se também em 1999. Com a entrada em operação, em 2000, da linha de cinescópios para monitores de vídeo da Samsung, associada a contratos de exportação, esses valores não deverão sofrer redução nos próximos anos.

A recuperação do segmento de consumo certamente irá aquecer as importações de cinescópios, em particular aqueles de tela grande, cuja participação na demanda é crescente. Esta situação deverá ser agravada pela TV digital, na medida em que as vantagens de definição da nova transmissão só se tornam mais nítidas nas telas maiores e que a recepção de HDTV requer telas com formato diferente das atuais, ou seja, na proporção 16 x 9 em lugar da 4 x 3 comum. Acresce que, na veiculação de sinais digitais, também podem ser utilizadas telas especiais, como a tela a plasma, sem produção local.

Vale ainda observar o rápido crescimento das importações associadas ao item Dispositivos de Cristal Líquido, o qual inclui tanto telas para monitores de vídeo quanto mostradores digitais. As telas de LCD propiciam a reprodução de imagens com altíssima qualidade e são adequadas à veiculação da televisão digital através de microcomputadores.

8. Ação do BNDES

Nos últimos dez anos, o BNDES vem apoiando o setor de televisão aberta através de uma centena de pequenas operações indiretas concedidas às emissoras, em geral para aquisição de infra-estrutura de transmissão. Algumas fabricantes dessa infra-estrutura também se beneficiaram de créditos indiretos para investimentos, além de terem seus produtos cadastrados na FINAME, possibilitando o seu financiamento aos compradores, no caso as empresas de radiodifusão.

O valor total desses financiamentos às operadoras e às fabricantes, no período compreendido entre 1990 e 2000, não chegou a 3 milhões de dólares. Isto permite concluir que, até 2000, o BNDES não havia tido uma atuação significativa junto ao setor.

A única exceção ocorreu no primeiro semestre de 2000, quando foi realizada uma operação direta com a emissora de televisão SBT, para modernização administrativa e operacional, no valor aproximado de 8,6 milhões de dólares.

Quanto aos fabricantes de televisores, as empresas brasileiras - especialmente a CCE, Itautec-Philco e Gradiente - foram beneficiárias de créditos, diretos e indiretos, que somam da ordem de 120 milhões de dólares na última década. Todos esses créditos visam a investimentos em produção.

As fabricantes Gradiente, Itautec-Philco e Sharp também obtiveram apoio, até a primeira metade daquela década, via participação acionária da BNDESPAR. Ao longo dos anos houve o desinvestimento, como é de praxe em operações dessa natureza, reduzindo tais participações a pequenos valores residuais.

9. Propostas de Ação

A superioridade de qualidade da imagem da transmissão digital de TV é melhor percebida em receptores com telas acima de 25 polegadas ou com telas especiais, o que coloca novamente na agenda de ações proativas do BNDES o apoio à fabricação nacional de displays para esses aparelhos, incluindo o vidro para a sua produção. É importante observar que a ampla disseminação da TV digital irá requerer a substituição de 50 milhões de receptores, aos quais certamente serão somados outros aparelhos, uma vez que se verifica a tendência de aumento da densidade de televisores por domicílio, hoje em modestos 1,25.

O apoio à produção de telas, como maiores itens de custo de um aparelho receptor de TV, é um dos passos na direção de viabilizar a implantação e o crescimento no País de uma indústria de componentes para a indústria eletrônica. Cabe ao BNDES, como principal instrumento de crédito de longo prazo brasileiro, um papel ativo no fomento e suporte financeiro a esse segmento, fundamental para a competitividade dos bens eletrônicos brasileiros.

Quanto às empresas de televisão e aos fabricantes de equipamentos eletrônicos de consumo, espera-se a continuidade do apoio do sistema BNDES, sempre no sentido de fomentar o investimento local, a competitividade, o adensamento das cadeias produtivas e a criação de conteúdos nacionais.

Particular atenção deve ser dada pelo sistema BNDES às empresas fabricantes de transmissores e antenas para infra-estrutura de televisão, normalmente empresas de porte médio, cujo aumento da competitividade é fundamental para garantir a sua presença num mercado para o qual se prevê grande expansão. Nesse sentido, é importante que elas possam ser apoiadas pelo BNDES, seja através de financiamento ou de participação em capital, para fazer frente, não apenas a novos padrões técnicos ou concorrenciais, como também a reorganizações societárias ou associações que se façam necessárias.

Finalmente, considerando a experiência já acumulada pela AO1 na realização de operações de financiamento à TV por assinatura e à indústria eletrônica de consumo, bem como no acompanhamento de todo o complexo eletrônico, julgamos conveniente que as futuras operações de financiamento que visem à adoção da nova tecnologia fiquem concentradas nessa mesma Área.

10. Conclusão

Dever-se-á buscar, com a TV digital, atingir praticamente toda a sociedade, a exemplo do que ocorreu com a TV aberta analógica. Para tanto, é necessário o estabelecimento, por órgão regulador, de metas de cobertura, tempos - e talvez indicativos de grade - de programação e introdução de alguns novos serviços interativos. A qualidade da recepção, por sua vez, é fator decisivo na opção do consumidor pela nova tecnologia, o que obrigará a uma adequada combinação da ampliação do número de canais com a melhoria da qualidade da imagem.

Para que haja uma efetiva disseminação da TV digital no Brasil, é necessário que a oferta de programação pelas operadoras esteja também perfeitamente sincronizada com a oferta de televisores pela indústria de consumo. Isto porque somente o crescimento da demanda possibilitará a redução de custos e preços dos receptores e set top boxes.

Os preços dos receptores são fortemente dependentes da existência de componentes específicos no mercado mundial, uma vez que não há alterações básicas no processo de montagem dos produtos finais. Estes, a nível de circuitos, diferem pouco dos equipamentos analógicos, porém tal diferença está consolidada em um conjunto de componentes integrados (chip set) específico, produto direto da escala internacional demandante. É a escala que determina a maior integração de circuitos em componentes e, portanto, a redução dos custos.

A articulação com outros países da América Latina é fundamental para garantir uma maior demanda, principalmente para receptores de TV digital. Neste sentido, o Governo brasileiro deve ter postura ativa, seja através dos Ministérios envolvidos, seja através da ANATEL. Note-se que, a não ser em uma pequena escala na Argentina, não existe uma indústria latino-americana de bens finais expressiva em nenhum país da América do Sul.

As pressões da TV digital sobre o déficit da Balança Comercial não dependem do padrão de modulação a ser adotado e, mantidas as condições atuais, envolverão um aumento da importação de equipamentos e componentes, principalmente as telas grandes e especiais. Entretanto, é possível aproveitar o momento da descontinuidade tecnológica como oportunidade para uma maior participação brasileira no cenário internacional.

Desta forma, o processo de escolha do padrão de TV digital a ser adotado pelo Brasil deverá objetivar, não apenas as melhores condições tecnológicas, mas combiná-las com a atração de vantagens competitivas para o País, nomeadamente o adensamento da cadeia produtiva e melhores resultados na balança comercial do complexo eletrônico. Isto inclui a participação ativa no desenvolvimento tecnológico do padrão, na produção de equipamentos e componentes, no projeto de produtos - transmissores e receptores - e no desenvolvimento de software.

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